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A MUSICA E EU

Minha mãe costumava dizer que comecei a cantar antes de falar e, segundo ela, desde muito jovem eu ja murmurava algumas musicas. Por volta dos seis ou sete anos ela me levou algumas vezes a  programas infantis na TV Record (Zas Tras e Pullman Junior) e em uma destas oportunidades estavam lá Durval de Souza (o apresentador) e Nilton Cezar (famoso cantor naquela época).

Minha mãe, orgulhosa, disse ao Nilton Cezar, apontando para mim: "Ele canta suas musicas". Ele me pegou no colo e pediu que cantasse e eu "cantei" uma de suas canções chamada Professor Apaixonado. Quarenta anos depois estava almoçando no tradicional restaurante O Leite em Recife e, para minha surpresa, Nilton Cezar estava na mesa ao lado e, claro, não pude deixar de interromper seu almoço para lhe contar esta lembrança. Foi muito legal.

Aqui esta uma de suas famosas canções que faziam parte do meu repertório infantil: 

E depois?

A infancia

Nossa familia era muito humilde. Sem recursos, sem informação e sem condições de me proporcionar uma educação musical ou para comprar instrumentos,  e a musica ficou adormecida por um tempo.

Meu pai, gostava de musica e costumava ouvi-las após o jantar. Enquanto eu e minha mãe (meu irmão ainda não havia nascido) íamos para a sala assistir a novela (O Sheik de Agadir) ele permanecia à mesa ouvindo suas canções e me recordo da canção Porta Aberta de Vicente Celestino. 

Em 1969, ao comprarmos creme dental a embalagem trazia como brinde um disco com a musica A Praia de Agnaldo Rayol, um grande nome da musica brasileira. O disco era de papelão que foi guardado até que tivéssemos um toca disco, o que só aconteceu alguns anos depois.

No inicio dos anos 70 ganhei de presente um pequeno toca discos, do tamanho de uma pasta de documentos, tão pequena que os LP's eram maiores que ela. Além de poder tocar meu disco de papelão também pude ouvir dois discos que vieram como parte do presente, Um disco dos Beatles (Hey Jude - 1970) e um Single de Johnny Mathis com a musica Love Story (que faz parte do meu repertório). Foi um presente e tanto.

Nunca incluí as musicas do Beatles em meu repertório (com excessão de umas duas) mas Johnny Mathis foi, em minha opinião, uma das grandes vozes de todos os tempos.

A adolescencia

As escolas publicas tinham uma matéria chamada Elementos do Canto Orfeônico e, para que pudéssemos praticar, era necessário ter uma flauta doce, e este foi meu primeiro instrumento musical o qual tenho até hoje. Nunca consegui ler partitura, embora conheça a teoria, mas me dei conta de que esta maravilhosa técnica de transformar aquelas "bolinhas"em musica não era para ser aprendido nesta vida. Aquelas bolinhas não são para mim!!!

A musica estava sempre presente sobretudo nos famosos "bailinhos" dos anos 70, reuniões nas garagens das casas onde podiamos dançar e beber cuba-libre.

Sem falar nos equipamentos. Meus amigos do bairro tinham bons equipamentos de som, os inigualáveis 3 em 1 que faziam minha pequena "vitrola"parecer um brinquedo sem graça, sobretudo porque não tinha duas caixas que faziam o tão sonhado som estéreo.

Alguns mais abastados, tinham os poderosos amplificadores Quasar, e toca discos fantásticos que tornavam nossos bailes uma experiencia incrível.

Enfim um violão

Em 1980 meu irmão recebeu um violão de presente e eu passei a compartilhar aquele interessante instrumento, logo iniciando aulas de musica, já às minhas custas.

Minha saudosa professora não ensinava teoria musical nem as temidas bolinhas, mas usava uma metodologia baseada em cifras e em uma sequencia harmônica de apenas quatro notas que permitiam "tocar"muitas musicas desde que decorasse as sequências. Usei isto durante anos.

Aquilo foi um sucesso. Levava o violão para todos os lugares e me arriscava a soltar a voz, ainda que de maneira desajeitada. 

O repertorio da minha professora foi ficando escasso para atender minha demanda por mais musicas, foi quando percebi que as bancas de jornais vendiam revistas com um repertório muito maior do que o da minha professora.

Baseadas no sistema americano de cifras, as revistas trouxeram novas possibilidades, ainda que em um sistema complicado pois tínhamos que carregar uma infinidade de revistas para todos os lugares.

O violão me acompanhou durante muito tempo para todos os lugares onde eu ia e muitas são as histórias pelos bares da vida, embora nunca tenha sido um verdadeiro violonista.

Ainda comprei uma guitarra e caixa acústica, mas as cordas de aço machucavam meu dedos, além do que não era apropriada para levar a pequenas reuniões ao ar livre . Logo ela se foi.

Os Teclados

De todos os instrumentos musicais, o que mais me encanta são os teclados. No inicio dos anos 80 comprei um destes equipamentos do tipo órgão, com dois teclados, pedais de baixo e múltiplos instrumentos além de acompanhamento rítmico. Uma verdadeira orquestra.

O equipamento trazia consigo um livro de musicas com o mesmo sistema das minhas revistas de violão e não tardei a adaptar o pouco que tinha aprendido no violão para os teclados.

Intuitivamente tocava varias musicas, mas os erros no teclado eram muito mais visíveis do que a minha deficiência nas cordas. Assim decidi me matricular em uma aula de teclados, no famoso conservatório Mitani na avenida dos Bandeirantes, mas o curso não passou da primeira aula. 

A professora me deu uma partitura da musica Asa Branca e imediatamente comecei a tocar como se a partitura não estivesse ali, o que obviamente não agradou à professora. Achei seu sistema monótono e sem brilho e nunca mais voltei.  Nunca aprendi verdadeiramente a tocar, mas me divirto ainda hoje com o som intuitivo que vai me fazendo pressionar as teclas do teclado um pouco mais sofisticado que aquele primeiro.

O mundo digital

Em 1984 surgiram os primeiros Karaoke's no bairro da Liberdade em São Paulo, inicialmente restrito ao publico japonês ja que a maioria das canções eram naquele idioma. Um amigo me levou a um destes lugares, justamente em um dia que se dava um concurso. 

O playlist tinha a musica Yesterday dos Beatles (uma das poucas que não eram em Japonês) e la fui eu para minha primeira competição, em "território" estranho e talvez o único sem "olhos puxados"naquele  lugar. Ao final fui vencedor e sai de la com um litro de whiskey , um belo presente para um iniciante.

Percebi que meu negocio era cantar. Tinha uma intimidade natural com o microfone e com o palco, algo impensável para aquele garoto tímido.

Percebi que a tecnologia era muito mais competente para me acompanhar do que eu mesmo em qualquer instrumento. Estava ali o futuro. 

Os Karaokes se popularizaram e os equipamentos passaram a ser acessíveis e, claro, comprava tudo o que era lançado. Carregava os equipamentos para todos os lados, ligava em um tv e em um aparelho de som e a festa estava garantida.

O mundo digital II

Sabe aquela frase: "voce gosta de cantar não é? Porque não aprende?" No final dos anos 90 me matriculei em uma escola de musica para cantar. 

De fato a escola, além de ensinar musica nos permitia de dar vazão ao nosso lado artístico. Com equipamentos de ultima geração, estúdio de gravação e um interessante esquema de promoção de shows, a escola promovia shows anuais em grandes casas de eventos. Um verdadeiro sonho para os artistas amadores que pisavam nos mesmos palcos de seus ídolos.

As aulas? Bem, não eram exatamente aulas, mas sim um momento de relaxamento das tensões do dia a dia. As vezes nosso atencioso Maestro nos recebia com um whiskey  e dizia a todos que tínhamos uma voz maviosa. Além de brilhante musico era um Marqueteiro e um terapeuta. Bons tempos!!

Minha curiosidade me chamou a atenção para o fato de que o teclado usado na escola tinha uma entrada para diskete (sei que muitos não sabem o que é), tal qual tinha no meu computador da empresa.

Depois de alguma pesquisa conheci e aprendi muito sobre a tecnologia midi que veio a revolucionar minha relação com a musica me possibilitando ter a disposição centenas de musica que podia cantar no tom que quisesse. Uma maravilha.

Vamos cantar?

Inicio dos anos 2000. Um determinado dia fui a um asilo fazer doações de cobertores para a campanha do agasalho. Era um domingo, próximo da hora do almoço. 

Fui convidado a entrar e conhecer a instituição e para minha surpresa, o "Velinhos" estavam se divertindo junto a um radio, já que não tinham ninguém para visita-los. Comovido com aquela situação, resolvi convidar alguns amigos para levar um pouco de diversão àquelas pessoas abandonadas por seus familiares. Surge o Grupo Bequadros.

Bequadros 

Eu, meu irmão Nilson, a pequena Sandra, Fernanda, Luci e Reinaldo formámos o Grupo Bequadros, nome dado por Silvia minha esposa, nossa dedicada Coach para diversos assuntos, desde roupa, comportamento no palco etc.

Nosso objetivo original era cantar nos asilos para os idosos que passavam a maior parte do tempo sem ter o que fazer e, invariavelmente, gostavam de musica. Levávamos algo para comer e beber a fazíamos a festa com eles, saindo de lá com uma grande leveza em nosso ser.

Mas boa parte destas instituições eram carentes de recursos e tinham necessidades difíceis de serem atendidas. Surgiu a ideia de fazer festas beneficentes e la estávamos nós todo sábado cantando para centenas de pessoas de maneira voluntária para angariar recursos.

Ao longo de cerca de 10 anos colecionamos muitos momentos bons alem de termos nos divertido muito, ajudando as pessoas com a nossa voz.

Quase. Era 1986. No auge dos clubes de Karaoke, agora mais populares, as casas noturnas tinham vencido a barreira do bairro da Liberdade para marcar presença em diversos lugares. Em determinados momentos haviam grandes concursos e lá estava eu, claro.

Naquele ano me inscrevi no campeonato estadual de Karaoke e fui vencendo as etapas até chegar à Grande Final. Apesar do compromisso artístico tive que ir à faculdade onde cursava um curso de Pós Graduação com Silvia, minha esposa. Eu a convidei para ir à final e ela aceitou.

Fiquei em terceiro lugar, mas ganhei uma namorada.

Ao final do concurso fui abordado por um representante de uma gravadora que me ofereceu a possibilidade de ser profissional, fato que deixou muito orgulhoso.

No dia seguinte contei ao meu pai e pedi ele sua opinião.

Com a sinceridade que lhe era peculiar, ele disse: "musica não dá dinheiro. Tem muita gente boa por ai sem oportunidade. Se eu fosse você continuaria seus estudos e sua carreira no mercado financeiro e teria a musica como diversão. Sem compromisso, e sem depender dela".

Achei bom o conselho e resolvi seguir. E foi bom!!

E assim sigo até hoje, canto o que quero e quando quero.

Profissional ?

A india
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